domingo, 20 de setembro de 2009

Guerrilheiros no poder

Segue abaixo trechos de um artigo do jornalista e psicanalista Reinaldo Lobo
publicado no jornal O Estado de São Paulo em 7/8/2005.
Me faz pensar o quanto nos vemos cercados de "guerrilheiros" na nossa política,
e o quanto seus comportamentos ditatoriais , presunçosos e prepotentes,
disfarçados sob uma roupagem "romantica" de defensores do povo,
são capazes de destruir tantos trabalhos sérios e desmotivar profissionais comprometidos.
E nem preciso ir longe...



Os guerrilheiros no poder

Reinaldo Lobo
Psicanalista e ensaísta

Guerrilheiro não rouba. Expropria. Ele não mata, não seqüestra nem lincha. Promove justiçamentos democráticos. Parece um jogo de palavras, mas não é. O guerrilheiro acredita possuir uma "ética especial", típica das situações de exceção, de revolução e de guerra. Essa ética costuma ser a mesma com que se tenta justificar hoje o terrorismo: os defensores dos oprimidos têm direitos especiais de agir, em qualquer tempo, para mudar a sociedade e o mundo. Aplicada ao cotidiano da vida democrática, essa moral revolucionária resulta numa perversão da política. ...

... A guerrilha é o perigoso romantismo da aventura em política. Ele induz a soluções simplórias, às vezes ao suicídio. Essa moral de limites extremos não combina com a política comum de uma sociedade democrática. Fora do contexto revolucionário ou bélico, ela degenera em pura psicopatia, banditismo e violência. O pathós do guerrilheiro é o de um aventureiro, em geral com as melhores intenções. Ele sofre de impaciência política. Quer cortar caminhos e pegar atalhos para o poder. Nutre, muitas vezes, um certo desprezo pelo cotidiano cinzento da política e pelo povo, concebido como uma entidade abstrata e sem alma. Acredita no golpe de mão e na força da vontade acima de tudo. Sua aura romântica recobre umas áreas sinistras, cuja demarcação costuma ser indefinível. Quando essa imagem se define, às vezes no poder, o que era paixão juvenil se torna frieza jacobina e ação destinada a destruir os inimigos. Um guerrilheiro não tem adversários, só inimigos. Quanto aos aliados, são circunstanciais, instrumentos de uma guerra. Só os objetivos contam. O guerrilheiro convive apenas com o idêntico a si mesmo. O outro, o diferente, não interessa. ...


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